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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Evito Remédios


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Ah, isto eu evito. Sei que escribas hipocondríacos, os mais diversos, já abriram suas almas em público, esquecidos da elegância de Castilho ao dizer “tediosa e impolida coisa é falar homem de si próprio”. Em todo caso, cada caso é um caso e, no meu caso, avança o barco na contramão dos maníacos por remédio. Sou e sempre fui avesso ao mundo medicamentoso.

É bem verdade que, há alguns anos, certo angiologista, depois de bem examinar o fluxo sanguíneo em minha carótida, convenceu-me a ingerir, todos os dias, um comprimidinho de AAS, às refeições e, à noite, rebater com outro, chamado Sinvastatina.

Explicou-me o versado em carótida (Honni soit qui mal y pense) que o Ácido Acetil Salicílico inibe a agregação de plaquetas evitando formar trombos nas veias e artérias. Já as Estatinas são inimigas mortais do LDL (o colesterol escroto), perito em obstruções arteriais. Ante tão doutos argumentos, aquiesci nessas duas exceções, mas, como disse, evito tomar remédios.

Não posso negar também – minha honestidade exige a ressalva − que, há uns cinco anos, ouvi de meu cardiologista que pressão acima de 14 é “pressão alta”. São novos parâmetros, diz ele, adotados no mundo da prevenção de infartos e AVCs. Dando-se que minha pressão é useira e vezeira em alcançar os 15, principalmente quando fico “pê” da vida com alguma coisa, recomendou-me ele dois comprimidinhos diários de Losartana Potássica.

A explicação é que a droga impede a retenção de sódio e água no organismo, evitando hipervolemia e a consequente hipertensão arterial. Mesmo boiando no que fosse “hipervolemia”, assustado com algumas sequelas de AVC que já vi por aí, decidi abrir mais uma exceção. O café da manhã vem me ajudando a engolir também esses dois comprimidos. Sem prejuízo, claro, de minha obstinada posição de abominar os fármacos. 

Certamente ficaria nisto não fosse a tendência que tenho à deprê ante as falsetas da vida. E foi num desses dias de alma estomagada que procurei psiquiatra e ele me provou, por “a” mais “b”, que depois de uma “certa idade” as inquietações do espírito são naturais e que, todos, devíamos tomar, de preferência à noite, uma inofensiva cápsula de Cloridrato de Sertralina.

Foi mais longe o esculápio. Disse que as Secretarias de Saúde deveriam colocar Cloridrato de Sertralina nas caixas d`água de todos os contribuintes do IPTU com mais de quarenta anos. É que o miraculoso fármaco inibe a “recaptação da serotonina” – boiei de novo − mandando tudo que é angústia às favas.

Serei injusto com o generoso princípio ativo se negar que, por obra de sua ingestão, venho conciliando velhos sonhos condoreiros da juventude com minha pífia realidade hodierna. Sem abandonar, todavia, meu direcionamento básico, o leitmotiv wagneriano, sagrado, de fugir à química laboratorial. 

Exatamente por isto, enorme foi minha apreensão quando uma terrível dor no joelho passou a crispar meu semblante sempre que me erguia de uma simples cadeira.  O ortopedista diagnosticou artrose avançada, com indicação de prótese no meu joelho direito. Diante do pavor que manifestei por um gonzo metálico dans mon genu, aconselhou-me ele – sem muito entusiasmo − a usar Sulfato de Condroitina associado à Glucosamina, para tentar reconstituir a cartilagem gasta.

Tratamento longo e resultado duvidoso − ressalvou. Pois mesmo esse prognóstico pessimista me pareceu mais simpático que serrar o joelho, jogá-lo aos cães qual mocotó de jegue, substituindo-o por uma dobradiça estilizada. Passei a tomar, todos os dias, às refeições, uma drágea de Condroitina com Glucosamina. Decisão detestável, já se vê, considerada minha rígida resistência a remédios.

Infelizmente, nada evita aquela quadra da vida em que reinam as preocupações. Quando não é com filho é com neto, com esposa, com irmãos, cunhados, amigos virtuais ou companheiros de golo. Um inferno astral. Quando não se perde o sono, perde-se a tranquilidade do sono.

Certa noite o socorro veio pelo telefone. Não paguei consulta. “Não se mate Carlos” − disse-me, drumondianamente, meu cunhado médico. Tome um Olcadil todas as noites, ao deitar-se. É ticket to ride para a paz dos travesseiros! – prescreveu.
Não é que resolve! Não seria um simples Olcadil 2mg que iria comprometer meu propósito inabalável de sempre fugir às medicações.

Transgressões outras não pratico, afora o hábito salutar, herdado de minha mãe, com relação à homeopatia. Considero que Homeopatia escapa ao conceito geral de droga. Similia similibus curantur – são semelhantes curando semelhantes. Para febre, faço uso de Aconitum e Briônia e, para dores lombares,sirvo-me de Acheflan ou Flexive, sendo estes dois últimos da classe dos fitoterápicos, para os quais não vejo razão para minha costumeira intransigência.

O mais importante na vida é escapar com ela. 

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(Publicada  em http://www.bloghetto.com.br/ a 15.03.2013)

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