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Julho, 2007
Embora o exemplo deva vir de cima, no caso brasileiro a chamada “Câmara Alta” demonstra não ser padrão de ética e compostura. O Senado Federal vem sendo avacalhado pelos senhores senadores da república e seus suplentes lamentáveis. O presidente da Casa, acusado de pensionar a amante com dinheiro escuso, comprovadamente entregue à “gestante” por um lobista da Construtora Mendes Júnior, defende-se “provando” lucros pecuários astronômicos em terras do agreste alagoano.
Quase ao mesmo tempo, suspeito de “gratificar membros do Judiciário” que lhe salvaram o mandato, com verbas graciosamente cedidas pelo proprietário das Linhas Aéreas – GOL, o Senador Joaquim Roriz se agarra à pretensa compra de uma VACA, por 300 mil reais, para explicar o sumiço de 1,2 milhões! Renunciou para não ser cassado, mas seu suplente não tem folha corrida limpa e não deverá emplacar os restantes, 7 anos de mandato.
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Democracia no terceiro mundo é essa coisa complicada. Por exemplo, para tornar-se juiz e aplicar a lei, o candidato tem que fazer curso de graduação em direito, apresentar prova de títulos e uma batelada de certidões negativas de distribuidores cíveis, criminais, atestados de bons antecedentes, etc.
Com vida imaculada, boas luzes jurídicas, cultura geral rica e dando sorte de passar num concurso duríssimo, vira APLICADOR das leis, isto é, Juiz de Direito.
Já, para tornar-se senador, deputado, vereador (portanto um FAZEDOR de leis), o cidadão não precisa curso, nem concurso, nem ficha limpa. Muito pelo contrário, muito pelo contrário! Quando tem, costuma até atrapalhar. O povão se amarra é em pilantra semi-analfa.
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Apesar de tudo, ainda acho que a qualidade do homem público brasileiro não piorou nem melhorou. Sempre foi mais ou menos assim. Hoje as (sem) vergonheiras pipocam mais porque as comunicações evoluíram ao tempo real, temos um Ministério Público atuante e a Polícia Federal tornou-se muito eficiente.
Ficou mais visível até uma particularidade interessante. Para governar, o Presidente da República tem que dividir o bolo com os trapaceiros que infestam a política partidária. Submisso a tal circunstância, ele acerta com os partidos, reparte tudo direitinho e constrói a chamada “governabilidade”. Providencialmente, entretanto, ele coloca no Ministério da da Justiça, alguém de confiança que deixe a Polícia Federal agir.
É só rato caindo na ratoeira! Os “partidos da base” se danam! Perdem força reivindicatória. Acho divino!.
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Vejam o paradoxo. Senador não é representante do povo. É representante do seu Estado.
-Como pode um representante de Estado inexpressivo como Alagoas (dependente de verbas federais até pra comprar o papel sanitário do gabinete do governador) ter a força que o atual presidente do Senado vem demonstrando ter diante de representantes de São Paulo, Minas, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Goiás, etc ?
-Tem lógica?
Por outro lado, justificam-se 3 senadores para cada Estado da União? Gente, num país que tem programa contra fome, isto é um rematado absurdo.
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A esperança deve prevalecer. É claro que a coisa vem melhorando. Quando acontece a desistência do Cafeteira, a renúncia do Salgado (milionário da baixada fluminense a quem os mineiros elegeram Senador, sem saber), a renúncia do outro suplente, Sibá Machado, e a perda do controle sobre o Conselho de Ética pelo Senador Renan, é porque uma força muito construtiva está atuando.
-Que força é esta? Claro, a imprensa responsável e a consciência crítica dos brasileiros lúcidos.
Precisamos acabar com essa ridícula “suplência” de senador. É uma trapaça contra a vontade do eleitorado. Serve para colocar no congresso, às escondidas, financiadores de campanha e oportunistas de ocasião.
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O resultado é essa vergonheira. Todos com medo do presidente do Senado. Ele “sabe demais”, de cada um. É rabo preso pra todo lado. Para dar uma satisfação ao eleitorado o sujeito vai à tribuna, dá uma de bom moço proferindo dois ou três conceitos éticos bem teóricos e desaparece até a semana seguinte.
Parodiando Ponte Preta, o Senado é hoje uma lagoa infestada de jacarés e piranhas “onde sabido nada de costas”.
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Os jornais deviam ajudar a memória dos brasileiros não permitindo que um escândalo servisse para esquecer outro. É clara a tática dos senadores, de adiar o julgamento de um escândalo até o aparecimento de outro que o encubra. Aliás, para “salvar” Renan, apareceu logo o caso Roriz, mas tão escabroso que o homem não titubeou: renunciou sem gastar tempo. Não quis arriscar a elegibilidade.
Seria bom se algum bom jornal abrisse título fixo para algo como "Escândalos derradeiros”. Em breves sinopses, manteria na primeira página, como carne-de-sol no varal, a memória fétida dos cinco últimos escândalos. Deixa apodrecer.
Como diria o Magri, mosca varejeira também é gente.
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Essas coisas não têm fim, mas vamos ficar na última frase do Renan Calheiros, agarrando-se à presidência do Senado: "Se eu deixar a presidência, serei um senador zumbi, um morto-vivo." Tem toda razão. É claro que, zumbi por zumbi, é bem melhor (para ele) continuar “presidente zumbi” que “senador zumbi”.
O problema é saber se isto é bom para o conceito da nossa Câmara Alta, que ele preside, e para a imagem do país. Coisa com a qual certamente não se preocupa muito um neo-coronel, daqueles lá de riba.
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(Publicado no LEOPOLDINENSE de 30.07.2007)
sábado, 14 de agosto de 2010
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