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Novembro, 2010
Novembro, 2010
Não sei se ando administrando bem o meu tempo. Hoje mesmo por pouco esta crônica não sai da toca. Pressionado por um punhado de urgências cheguei a procurar assunto rápido no noticiário, mas a ênfase na violência e na crise econômica mundial me dissuadiu das atualidades. Vamos inventar tempo de pensar noutras coisas.
Minha vida é de correria. Faltando-me hora pra tudo. São histórias e mais histórias que improviso para escapar a eventos sociais, para não aderir a projetos alheios... Mesmo sob o constrangimento da desculpa esfarrapada no lugar da verdade verdadeira que poderia pegar mal.
Natural a pessoa que gentilmente nos convida para alguma coisa, que para ela é importante, achar um tremendo pouco caso trocarmos sua conspícua companhia, ou proposta, por “algo tão frívolo”... Só que, para nós, não é frívolo, ora bolas!
Quando alguém opta por dar as costas a badalações já o faz no pressuposto de que seu tempo de boiar nas espirais do cigarro será sagrado. Quem quiser que vá amanhã receber e homenagear Sua Excelência, que vá ao bingo beneficente, à debutância da filha do Aristeu, ao jogo de pôquer no caxixó da Lívia. Tem dó! Já fui semana passada.
Cada um resolva a seu modo o enigma do tempo. Até porque ninguém sabe direito o que é tempo. Cientistas levados a defini-lo saíram pela tangente com brincadeiras.
Einstein disse que o tempo é "uma ilusão”. Para ele, “a distinção entre passado, presente e futuro não passa de uma firme e persistente ilusão". John Wheeler, outro notável físico americano, foi ainda mais pilhérico: disse que tempo é "o jeito que a natureza encontrou para não deixar que tudo acontecesse de uma vez só".
Podem conferir no Google. Dois gênios da humanidade não entenderam o mecanismo da própria decrepitude. Ora, a prova de que o tempo existe é que só não o vemos passar quando estamos ocupados ou distraídos. Tão distraídos que não percebemos as erosões de nossa própria decrepitude.
Social e popularmente diz-se que "tempo se inventa" e que tudo se resume a saber programá-lo. O problema é impor socialmente nossa programação. Principalmente nas cidades menores, as pessoas se conhecem, são amigas, simpáticas, e querem sempre distinguir seus semelhantes com uma demonstração de carinho e apreço. Impossível não tratá-las com compreensão. Pero hay que endurecerse para que o controle da pauta continue em nossas mãos.
Consta que nos últimos 100 anos a vida média do ser humano dobrou. Contribuíram para isto a medicina, a alimentação mais adequada, a química farmacológica, os hábitos de higiene, o conforto. Paralelamente, novas técnicas e novas tecnologias, vieram otimizar o uso que fazemos do tempo − meios de comunicação dispensando presença pessoal; meios de locomoção mais rápidos etc. − e nem assim passou a sobrar tempo.
Ao contrário, a demanda de afazeres na sociedade moderna insiste em nos passar a impressão de que o tempo anda cada vez mais curto. Não apenas impressão. Anda curto, sim. Principalmente aquele tempo sagrado, para nós mesmos e para a família.
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(Publicado em 25.11.2010 em http://oglobo.globo.com/pais/noblat/mariahelena/)
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