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Dezembro, 2010
(Publicado em 02.11.2010 em http://oglobo.globo.com/pais/noblat/mariahelena/)
Dezembro, 2010
Bom, se a invasão das duas
maiores favelas do Rio virar fogo de palha e voltar tudo ao que era antes, o
problema não será meu, por conta dos elogios que no momento tenho àquelas
ações.
Dizem que o futuro a Deus
pertence, mas no caso da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão, imagino
pertencer também ao projeto político do governador Sérgio Cabral, que, aliás,
não deve ter outra coisa em mente que realizar um governo sério no Estado do
Rio. Com Lula e Aécio no horizonte federal − sem descartar a hipótese de
sucesso do governo Dilma − o melhor que o governador do Rio tem a fazer, hoje,
é ir dando o melhor de si para ver o que acontece lá na frente.
Deixemos, entretanto, o macro
para focar o micro. Episódios que me emocionaram na ocupação dos dois enormes
conglomerados humanos, do Rio, foram a entrega à polícia de dois bandidos pelos
próprios pais. Aqueles gestos nos deram a medida exata do quanto é fundamental
para as pessoas a presença da autoridade constituída, e, ao contrário, o
desastre que representa a ausência dessa mesma autoridade num determinado local.
Palavras da mãe que, no Complexo
do Alemão, primeiro entregou seu filho, traficante, à prisão:
– Aproveitei a oportunidade porque nunca
aceitei meu filho nessa vida!
Ou seja, ela aproveitou que o
“império da lei” – que nunca estivera por ali - chegasse às imediações de sua
casa para fazer o que sempre sonhou para o filho: tentar tirá-lo do inferno do
tráfico.
O mesmo se daria no dia
seguinte. Um homem trabalhador, bombeiro e eletricista, de 55 anos, também
morador do Complexo do Alemão, pegou o filho de 25, que se alojara na casa de
uma vizinha, e o entregou às autoridades. Disse à imprensa:
–Agradeço ao BOPE por ter pego
meu filho vivo. Ele tem que pagar pelo que fez.
Pode-se duvidar de tudo, menos
que esse rapaz tenha um pai. Difícil, até, compreender que filho de um homem
com semelhantes princípios morais haja escolhido o caminho do erro. Só não se
corrige se não quiser. Pai ele tem.
Vejam que nem aquele pai, nem
aquela mãe, jamais aceitaram os filhos no mundo do crime. Salvá-los, todavia,
sempre esteve fora do alcance de suas mãos porque o Estado, que à educação e ao
direito provê, mantinha-se distante e omisso.
De repente, eis que “a lei”,
escoltada por tanques de guerra, chega às suas portas, sob aplausos e
cooperação da comunidade! No coração daquela mãe, no coração daquele pai, dois moços
incontroláveis, contumazes em decepcioná-los, voltam a ser crianças tomadas
pelas mesmas mãos que, carinhosamente, os colocaram de pé. Pais acreditam,
sempre. Basta uma chance mínima para que o desencanto logo ceda lugar à esperança.
A tomada do Complexo do Alemão,
acompanhada ao vivo pela TV, foi um alívio para toda a enorme população da
área, da cidade e do país. Vem sendo objetivo estratégico da Secretaria de
Segurança do Rio conquistar territórios ao tráfico, sempre com o menor número
possível de baixas inocentes e protagonistas.
Na ação desta semana o êxito foi
total. Houve quem desejasse ver metralhados os marginais que escapavam pelo
morro. Grande equívoco! Matar bandido não resolve. A sociedade licenciosa e o
vácuo de autoridade providenciam outros. Polícia sempre matou bandido e isto
nunca levou a lugar algum. Jovens desencaminhados são produtos de uma realidade
complexa que reclama educação e presença estatal.
Tráfico, bandidos, usuários de
drogas e pessoas de bem sempre existiram e sempre existirão. Faz sentido que
neste tumultuado contexto inicial, quando já se vai colocando a casa em ordem,
as forças do Estado, agindo sempre dentro da lei, deixem muito claro quem deve
respeito a quem.
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(Publicado em 02.11.2010 em http://oglobo.globo.com/pais/noblat/mariahelena/)
Realmente passou pela nossa cabeça que metralhar os fugitivos seria a solução do problema, mas sua análise é perfeita.
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