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Março, 1960
Por essa época eu não contava mais que quatorze anos e fora convidado para um “arrasta pé”, na roça. A festa vinha a propósito de um mutirão. Para os que não sabem, explico como é o mutirão nas fazendas. Havendo um trabalho de grande urgência, inadiável, e não tendo o rurícola - patrão ou empregado - meios para realizá-lo sozinho, ou de contratar ajudantes, apela para o mutirão. Este consiste em convidar todos os trabalhadores conhecidos na redondeza a dar um dia de trabalho gratuito ao necessitado.
Em troca dessa cooperação comunitária, um farto almoço é servido e, à noite, um formidável “arrasta-pé” a toque de sanfona. O local do baile pode ser o chão de terra batida do terreiro da sede, não raro coberto por um jirau de bambu e folhas de bananeira. A esta cobertura dão o nome de tolda. Donde o Baile de Tolda.
Durante a festança são servidas batatas-doce, assadas, mandioca, sucos e café, como numa festa de São João. A iluminação, precaríssima, à luz de lamparina de querosene. Saibam que estamos na década de 1950, numa área rural do município mineiro de Leopoldina. Nem pensar em luz elétrica.
Mas eu dizia que fora convidado para esse baile. A música estava a cargo do famoso sanfoneiro Orestes, um tocador de violão e um pandeirista.
Igual a um curral, lembro-me que o “salão” era repartido em dois, com cercados de bambus: uma parte maior onde todos dançavam, e outra menor destinada às moças. Assim, os cavalheiros, para conseguirem uma dama, deviam transpor uma espécie de cancela e tirá-la do cercado...
E tome calango!
O forró já ia lá pelas tantas quando, num canto da coberta, encostado num dos esteios da tolda, um mulato assopra uma das duas lamparinas, deixando a sala na penumbra. Foi aquela confusão.
- Pega, pega...! Sem vergonha...!
Ninguém imaginaria como aquela lamparina apagada pudesse dar início ao enorme quebra-pau que se seguiu. A impressão que se tinha, na escuridão, é a de que todos ali passaram a brigar. Ou, se não o fizeram, não foram muitos os que correram comigo.
Soube, no dia seguinte que, terminada a confusão, não deu para seguirem no baile. Uma faca qualquer rasgara o fole da sanfona.
- O sujeito que apagou a lamparina?
Ora, apanhou muito mas não fez por mal. Deu na telha dele. Talvez quisesse saber se apagar lamparina em baile na roça dava alguma confusão...
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sábado, 26 de março de 2011
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