Maio, 2011
Quem lhes denuncia virtudes na
ilusão não é sábio nem poeta. Apenas o que amanheceu confuso e talvez reclame compreensão
e piedade. Arranhei, sim, o tornozelo numa plantinha de espinhos contundentes,
conhecida como “sensitiva”, a qual maldizem possuir virtudes alucinógenas,
similares às de outra espécie, priminha dela, famosa por suas folhas
psicodélico-infratoras.
Para ajudar ainda menos,
Guimarães Rosa pelas encruzilhadas sinápticas do bestunto a recitar que “a vida
não é entendível”. O resultado, cá eu, do meu canto, a despertar manhãs sem
utopias. Daquelas em que o homem arrosta sua pequenez diante desse espasmo de onipresença
a que chamamos “nós mesmos”, frágeis interrogadores das inconsistências do
estar no mundo.
Meu alterego e guru, onipresente,
pondera nossa finitude – dele e minha – e proclama provas irrefutáveis de que
nesta vida tudo é ilusão. Difícil discordar, pelo menos no tocante à maior
parte das coisas. Diria que tudo o que a vida nos oferece, nessa embalagem para
presente que é o viver, seriam, sim, meras ilusões. Garranchos num quadro negro
que o apagador da morte absorverá sob forma de pó.
Duro o enigma de estar no mundo
por esta centelha a que chamamos vida, com seu sentido nebuloso e desfecho
aterrador.
Pisamos um universo que se
expande, os astros ganhando distância entre si qual manada de bodes que pondera
o desembesto da volta, na hecatombe definitiva em que tudo se reverterá ao nihil.
Passageiros da ilusão do ser,
seguimos irremediavelmente atrelados às galáxias no caminho do nãoser, quando
nada escapará ao pó e ao espaço. Nem o granito, nem o diamante, nem os cometas
com suas órbitas setuagenárias, nem os mais longínquos rochedos que os
aprisionam.
Temos, todos, encontro marcado em
novo estrondo epilogal que antecederá a quietude definitiva. Não soará um
lamento pelo Everest ou pelo David de Michelangelo!
Há prudência, pois, no cativar
ilusões. Elas nos servem à alma como o fígado ao corpo. Salvam-nos, a cada
instante, atenuando as toxinas da realidade trágica de que nascemos
protagonistas.
A quem me responde o espelho?
Apalpo-me e não me acho. Constato-me e não me creio. Descaindo do azul, lá
fora, um sol ingenuamente equívoco e sua luz provisória. Luz última a também
nãoser quando todos os sóis se apagarem.
(Publicada em 12.05.2011 em http://oglobo.globo.com/pais/noblat/mariahelena/)
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