Abril, 2005
Às vezes é interessante transitar pelo avesso de certas
notícias.
No dia seguinte ao falecimento do Papa João Paulo II,
desaparecido a 2 de abril de 2005, a agência Reuters noticiou e o Globo Online
transcreveu, às 9h:34m da manhã, a seguinte nota:
“Exames para comprovar morte
do Papa duraram mais de 20 minutos - CIDADE DO VATICANO - O Papa João Paulo II
morreu devido à septicemia e falência do coração, informou o Vaticano neste
domingo, segundo cópia de um certificado oficial de óbito assinado pelo médico pessoal do
Pontífice. A morte do Papa foi comprovada pelos resultados dos testes de
eletrocardiograma, que duraram mais de
20 minutos.”
A notícia, tal como acima transcrita, permite concluir então
que médicos não podem, responsavelmente, atestar a morte de uma pessoa sem
submetê-la (ou submeter o corpo) a um acurado exame que, no caso do Papa, cujo
óbito era mais do que previsível e o mundo inteiro esperava, levou 20 minutos.
Ora, isto não confere com a experiência de quem conhece a rotina
das UTIs. Os médicos das unidades de terapia intensiva, dispondo de todo aquele
aparato de rastreio das funções vitais − aparelhagem à qual o Sumo Pontífice seguramente
estava ligado − não levam mais que um
minuto para constatar o óbito e cobrir com a dobra do lençol a cabeça do extinto.
Dezenas de filmes, aliás, reproduzem a cena.
Também no cotidiano hospitalar, pelo menos no Brasil de que
temos conhecimento, vinte minutos do derradeiro suspiro é o tempo em que todas
as funerárias, furtivamente informadas do passamento, já telefonaram para a
família vendendo preparo do corpo e sepultamento.
Em pouco mais de meia hora o finado, transformado em
mercadoria funérea, em muitos casos já nem se encontra mais no necrotério do
hospital. Um apressado camburão de funerária particular, de negócio rapidamente
fechado com a família para não dar chance a concorrentes, já dobrou a esquina
conduzindo o féretro a uma capela mortuária.
E aí, como fica? O óbito do “passageiro” do camburão foi bem
apurado? Mediante exame de vinte minutos, como ocorreu com o Papa? O cartório
vai expedir o Atestado de Óbito com base em alguns rabiscos médicos de penosa
leitura e sem firma reconhecida?
O pior é que vai. Mesmo a gente sabendo que nem o DETRAN
emplacaria uma Variant sambada mediante documento tão precário. O Atestado de
Óbito será emitido.
A especulação pode parecer mórbida, sinistra, mas é a ilação
que sugere a insólita notícia. A menos que aqueles médicos à beira do leito de
João Paulo II estivessem contratados para trabalhar “por hora”.
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